Primeira vez ( esse ano, claro ) no Sesc Bom Retiro, para assistir ´Coriolano´:
O Sesc Bom Retiro é meio que um ´oásis´ na região do Centro de São Paulo conhecida como ´cracolândia´. É mais uma tentativa de revitalizar a região, mas claro, é insuficiente. Não vou entrar em maiores considerações sobre a região ( sou arquiteto e urbanista ), porque esse não é o tema desse blog. De qualquer maneira, fui de carro e estacionei dentro do próprio Sesc - é o mais seguro a se fazer. Aliás, quando comecei o texto afirmando que era a primeira vez no Sesc Bom Retiro nesse ano, é porque em 2012 - ainda antes de começar esse blog - estive lá para assistir ´Sonhos de uma noite de verão´, também de Shakespeare.
Diferente de outras unidades novas do Sesc, como o Santana, o Vila Mariana e o Pinheiros, no Bom Retiro não há um foyer exclusivo para o teatro. O acesso à sala se dá pelo hall principal do edifício. Lá dentro a sala é razoavelmente confortável, as poltronas são boas, mas o corredor poderia ser um pouco mais espaçoso. Só que...
É relativamente comum ver no Sesc turmas de alunos. Formação de público, interesse no tema da peça, enfim, são muitos os motivos para que isso aconteça, e todos louváveis, claro. Mas bem que os professores, e principalmente as famílias, poderiam dar uma pequena aula de educação antes do pessoal ir ao teatro. O comportamento de boa parte da platéia foi um horror. Gente conversando, fazendo barulho, e pior, num deteminado momento, quando Coriolano está jurando sua vingança, um rapaz começou a rir de alguma piada, ou de algo que viu ao telefone, não sei... só sei que não foi nada relativo ao que acontecia em cena.
Mas o que interessa mesmo é a peça, um texto de Shakespeare, uma tragédia incrível. Resumindo bastante, é a História de Caio Márcio ( Ariel Borghi ), um jovem general romano. Ele guia os soldados na vitória contra a cidade de Coriolus ( e daí ganha seu apelido, Coriolano ). Após a vitória ele é recebido em triunfo, mas para ser nomeado cônsul, tem que fazer um juramento de fidelidade à plebe ( representados por Josué Torres e Cacá Toledo ). O senador ( Carlos Meceni ), apesar de seu esforço, não consegue persuadir Coriolano, que então é expulso de Roma e se junta a seu antigo inimigo Audifius ( Pérsio Plensack ), e retorna com o exército dos volscos contra Roma. Mas antes disso, a mãe de Coriolano, Volumnia ( Esther Góes ) e sua esposa Virgínia ( Amanda Vides Veras ) vão visitá-lo em seu acampamento, e imploram para que ele desista de tomar Roma. Ao conseguirem isso, e portanto, ao manterem sua posição social, elas condenam Coriolano à morte, pois ao voltar ao acampamento dos volscos, ele sabe que será tomado por traidor também por eles, e será seu fim.
Só por esse resumo simplório já dá pra ver que é uma tremenda história. Mas tem muito mais... como em qualquer grande texto, há muitas leituras possíveis: existe o embate entre o que hoje chamamos de ´esquerda´, representada pela plebe, e ´direita´, nas idéias de Coriolano; os representantes da plebe são dois tribunos arrivistas, mais preocupados em conseguir posições para eles mesmos do que em defender os direitos do povo. Aliás, isso me pareceu uma coisa muito semelhante a certos personagens do partido dos trabalhadores de hoje em dia... mas essa é outra discussão. Há também um forte embate entre a moral de Coriolano e as conveniências políticas representadas pelo senador; o amor pela família ( a mãe e a esposa ) versus a manutenção do que Coriolano entende por honra... A ganância e a corrupção contra a ética ( mesmo que seja uma ética que nos é estranha hoje em dia ). Enfim, tem muita coisa a ser interpretada / entendida. Aliás, ia esquecendo: a adaptação do texto, feita pela Esther Góes e pelo Ariel Borghi ( filho dela ), foi feita de maneira a deixar o texto o mais coloquial possível para a nossa linguagem. Ou seja, a trama é complexa, é complicada, mas foram evitadas expressões e palavras de difícil compreensão para o espectador comum.
O cenário é simples, mas bem-bolado: colunas com arcos que formam pórticos, e que conforme a configuração e a iluminação do palco podem ser um pátio de uma residência, uma praça... já os figurinos são bem mais elaborados. Mas tudo isso não serviria de nada se não fossem os atores... e se o Ariel Borghi às vezes tropeçava no texto, me deu a impressão de que isso acontecia pela ênfase com que ele se colocava em cena. Josué Torre e Cacá Toledo, como os tribunos da plebe, também chamaram a minha atenção pelos malandragem com que dotaram seus personagens. Mas a grande cena mesmo foi o lamento da mãe de Coriolano, Volumnia ( Esther Góes ). Quando ela sai dos muros de Roma à noite, encontrar seu filho que está próximo a invadir a cidade comandando um exército inimigo, ela dá uma aula de interpretação, pois a personagem está ciente do que acontecerá caso ele venha a acatar o seu pedido de não atacar Roma - Coriolano será morto. Mas deixar que Coriolano mantenha seus planos significa acabar com sua própria vida, de sua família, de sua linhagem... a Esther solta um lamento tão profundo, tão visceral, que acho que mesmo quem estava lá somente para dar satisfação à professora, nesse momento ficou impressionado...
Enfim, apesar do incômodo causado pela platéia, o importante é que há uma ótima montagem disponível a preços populares no Sesc. Aliás, se não fosse o Sesc, acho que eu não teria como assistir a metade das peças que vejo. Salve o Sesc!
Coriolano
Com Esther Góes, Ariel Borghi, Pérsio Plensack, Carlos Meceni, Amanda Vides Veras,Jean Dandrah, Pedro Paulo Ferme, Josué Torres e Cacá Toledo
Texto de Willian Shakespeare
Adaptação de Esther Góes e Ariel Borghi
Direção de Esther Góes
Sesc Bom Retiro, até 13/out/13
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