sábado, 22 de março de 2014

Elis, A Musical

Elis, A Musical - um título com um trocadilho absolutamente pertinente:


Engraçado como fazia tempo que eu não ia ao Teatro Alfa, desde ´Um Violinista no Telhado´, mas só percebi que fazia mais de um ano por causa desse blog. Então, vamos aos comentários sobre esse espaço:  para mim, é muito longe...  junto à Ponte Transamérica, na Marginal Pinheiros, em um lugar que só é possível acessar de carro. E chegando lá ainda é difícil estacionar. Impossível conseguir lugar na rua ( escura e sem movimento ). E se houver lugar, há sempre ´flanelinhas´  ali ( claro que só na hora em que o espetáculo começa, eles nunca estão ao final ). Então, o jeito é deixar o carro nos estacionamentos mesmo, e há duas opções: ou do próprio Teatro Alfa, coberto, com manobrista, ou do outro lado da rua, quase em frente à entrada do Teatro, descoberto, com piso de pedrisco ( e com poças quando chove ) e onde você mesmo guarda seu carro. Ambos são caros, mas adivinhem qual o menos caro? Pois é,  o estacionamento do Teatro.... vai entender!

Acredito que o Teatro Alfa seja uma das maiores casas de espetáculo de São Paulo. E ao contrário de outros espaços, foi construído especificamente para esse fim, para ser mesmo um teatro. Tem uma entrada imponente, um saguão grande, escadas de acesso bem amplas, e de modo geral é bem decorado, sem excessos kitches. Lá dentro da sala de espetáculos o palco também impressiona pelo tamanho, e de maneira geral os assentos são bastante confortáveis. Nessa visita aconteceu um susto e uma boa surpresa: o susto foi descobrir que os lugares que havia comprado ( frisa lateral ) eram separados por uma coluna de aço de 40cm de diâmetro....  Eu estava ciente de que seria um lugar ruim, mas na página do Ingresso Rápido não há a marcação das colunas. Mas em seguida veio a boa surpresa: nesse dia deveria haver muitos convidados da Chevrolet ( tinha uma equipe para atender aos convidados da marca ), mas imagino que muita gente não compareceu. Então pouco antes do início do espetáculo os funcionários do Teatro convidaram a todos para ir aos assentos da platéia, bem em frente ao palco. Ou seja, não ficaram em uma postura mesquinha de que ´quem pagou por platéia elevada ou frisa que fique aí´,  o que sem dúvida foi uma postura muito simpática da produção. Além do mais, acredito que para os atores em cena seja bem mais agradável ver a platéia ali na sua frente cheia do que encenar para poltronas vazias, e ter o pessoal espalhado lá pra cima, onde não se pode vê-los. E os convidados que não compareceram não devem mesmo ter feito falta....  com tantas desistências, imagino que a maioria da platéia que estava ali era quem realmente estava a fim de assistir ao espetáculo e pagou por isso, e não gente que está mais preocupada em ´fazer social´ no foyer, como é comum a gente ver nesses eventos, ou em pré-estréias.

Outra coisa que vale a pena registrar é o programa da peça. Na entrada há uma lojinha de souvenirs, como costuma acontecer nos grandes musicais,  vendendo canecas, camisetas, livros, discos, bottons... e programas. Fizeram um programa em formato de capa de LP, muito bonito, ótima impressão, tudo muito caprichado. Mas o valor é o equivalente à entrada de algumas peças em cartaz na cidade, ou mesmo de um livro... 

Mas finalmente falando sobre a peça, ´Elis, A Musical´  é da mesma empresa produtora dos musicais ´Hair´, ´Um Violinista no Telhado´  e ´Rock in Rio, O Musical´.  E é com esse último que ´Elis´  guarda muitas semelhanças. Alguns atores são os mesmos ( Cláudio Lins e Ícaro Silva - mas esse infelizmente não estava presente na noite em que assisti ), mas principalmente se nota a mesma proposta em relação ao cenário: poucos elementos que vão se transformando durante o desenrolar da história, sem ´paredes´  ou um pano de fundo que determine propriamente um ´lugar´,  e o apoio de projeções e painéis eletrônicos. O recurso é bem econômico para a produção, mas funciona. O que interessa mesmo é a música, acho que não haveria razão para cenários grandiosos. Em compensação os figurinos me pareceram caprichados, com as roupas tomando certa importância em algumas cenas, como no início da carreira da Elis, quando ela saía de Porto Alegre para o Rio de Janeiro, e na apresentação de ´Como Nossos Pais´,  onde há um grupo de hippies. Se bem que nesse momento eu achei a caracterização um tanto fantasiosa demais... Hippies em 1976?   Vai ver que quiseram aproveitar os figurinos de ´Hair´....

Fiz um comentário maldoso agora, mas estou ciente de que a proposta do musical não é ser um ´documentário´,  mas sim uma elegia àquela que provavelmente foi a maior cantora brasileira de todos os tempos. E ainda bem que foi assim....   não é necessário encenar o vício em drogas nem a morte por overdose. Tanto que o musical termina com ´Redescobrir´,  do Gonzaguinha, em uma grande roda com todo o elenco. Só que cheguei ao final antes do começo....

A peça tem início com as primeiras tentativas de se apresentar em público da adolescente Elis ( Laila Garin ), ainda em Porto Alegre.  Os primeiros shows de calouros em companhia da mãe ( Keila Bueno ), e depois o relativo sucesso na então provinciana capital gaúcha. Daí a obstinação da Elis em chegar ao Rio de Janeiro, junto com o pai ( Ricardo Vieira ) que nem sempre confiava que a filha estaria fazendo a coisa certa. Esse é o prólogo, mas a coisa começa a ficar interessante mesmo quando Elis chega ao Beco das Garrafas, e aí começa a conviver com Miele ( Germano Melo ), Ronaldo Bôscoli ( Tuca Andrada ), Lennie Dale ( Danilo Timm ).  Claro que são personagens muito mais ricos e interessantes que os pais de Elis, e a partir de ´Menino das Laranjas´  a personagem principal começa a mostrar a que veio.

Laila Garin não é fisicamente parecida com a Elis Regina, nem tem o timbre de voz que lembre a ´Pimentinha´.   Mas talvez por isso mesmo, se encaixa muito bem no papel. Caso a escolha tivesse sido por alguma atriz mais parecida, a gente ficaria sempre com a sensação de ´cover´,  e não é isso o que acontece. Em cena está uma ótima cantora ( que é claro, procura manter um registro parecido com as gravações da Elis ), mas que não entra na simples imitação. Por outro lado, para quem conhece momentos marcantes da carreira da Elis ( o ´eliscóptero´  de Arrastão, a gravação de ´Atrás da porta´, a entrevista para o Fernando Faro, no programa ´Ensaio´ )  vê que o trabalho de recriação dos trejeitos, da prosódia da Elis, foram muito bem-feitos. Aliás, um dos melhores momentos da peça é quando Lennie Dale faz um trabalho de corpo com Elis, em ensaios no ´Beco das Garrafas´. Danilo Timm sem dúvida rouba a cena quando aparece no palco, imagino que ele tenha uma formação em dança muito superior aos demais membros do elenco. Aliás, essa cena foi mesmo uma das minha preferidas, quando ela se apresenta com a formação bateria / baixo / piano.

Tuca Andrade como Ronaldo Bôscoli também me pareceu uma escolha adequada, ele consegue imprimir um tom cafajeste / simpático ao personagem, que trai a mulher e que chega mesmo a agredi-la, mas que sempre tem uma saída divertida para a situação. Já o Miele de Germano Melo eu achei um tanto ´bonzinho´  demais, até onde eu sei o Miele sempre foi um ´coadjuvante´  divertido e importantíssimo, mais do que simplesmente alguém que tem os amigos talentosos. E foi uma pena que na noite em que eu assisti ´Elis´ o Ícaro Silva não estivesse presente. Ele foi um dos destaques de ´Rock in Rio´,  e o personagem Jair Rodrigues teria sido um prato cheio para ele. Quem estava em cena era Lincoln Tornado, que se não chegou a ser uma presença marcante no palco, também não comprometeu. 

A peça vai acompanhando mais a trajetória da Elis com seu relacionamento amoroso com Bôscoli e suas gravações, e também vão aparecendo nomes como Milton Nascimento, Ivan Lins, João Bosco, Renato Teixeira. Até que chega o momento do relacionamento com César Camargo Mariano ( Claudio Lins ).  Não tenho tanto conhecimento sobre o Mariano para dizer se a caracterização estava de acordo com a pessoa ´real´  ou não, mas o que quero registrar é que a partir do momento em que há alguém ´menos louco´  ao lado dela, o enredo passa a tratar a Elis com mais humanidade, no sentido de que em contraste com a sensatez e a bondade do marido, a Elis é que passa a ser o elemento desagregador da relação ( como antes havia sido o Bôscoli ). Achei interessante esse posicionamento dos autores, trazer isso em cena, e não ficar na louvação de uma mítica ´super-Elis´  o tempo todo. E por falar em caracterização, o ponto baixo foi o Tom Jobim ( Leo Diniz ). Difícil de ver o Tom como praticamente um paspalho em cena, alienado, sem-noção....

Quanto aos números musicais, é claro que há certa variação de qualidade. Em geral, os momentos de coro são os menos interessantes, quando a Laila Garin está solo é melhor. Mas os duetos com o ´Jair Rodrigues´ são interessantes, e o pout-porri com músicas do Milton Nascimento. O ponto alto acho que foi a interpretação de ´Como nossos pais´, e o baixo...  ´As aparências enganam´,  cantada pelo personagem César Mariano ( Claudio Lins ). Apesar de pertinente com a trama, ficou algo arrastado, sem a força com que a gente está acostumado a ouvir nas gravações.

Claro que o fato de ser fã da Elis ajuda a mim e à platéia de modo geral a gostar do espetáculo. Mas é mesmo um bom musical, que presta uma homenagem bonita à Elis. Com o fato de muita gente ter se reposicionado dentro do teatro, aconteceu da peça começar um pouco atrasada, acho que uns 15 minutos. E só terminou depois de três horas ( incluindo o intervalo ), mas o que eu vi foram pessoas felizes saindo do teatro, e não gente louca para ir embora. Muitos saíram cantarolando suas músicas preferidas da Elis, e aposto que assim como eu várias pessoas procuraram colocar a Elis para tocar no carro, na volta pra casa. Realmente, saímos de lá com aquele gostinho de ´quero mais´.






Elis, A Musical
Com Laila Garin, Tuca Andrada, Claudio Lins, Germano Melo, Danilo Timm, Ricardo Vieira, Leo Diniz, Keila Bueno, Lincoln Tornado
Texto de Nelson Motta e Patrícia Andrade
Direção de Dennis Carvalho
Teatro Alfa até 13/jul/14



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