Um programa um pouco diferente, ópera ao invés de teatro ´normal´:
O Theatro São Pedro, na Barra Funda, é dos mais antigos de São Paulo, foi inaugurado no início do século XX. Ainda assim eu só vim a conhecê-lo no ano passado, quando assisti a outra ópera nesse espaço. Apesar de ficar em um bairro que precisa ser revitalizado, o trecho onde ele está localizado, na rua Barra Funda, é um lugar de fácil acesso, e eu pelo menos não me sinto acuado ao estacionar nas ruas das imediações ( coisa impossível de fazer na Sala São Paulo, por exemplo ). E o teatro em si é muito legal, uma construção eclética que atendia à burguesia da época, que morava nos Campos Elíseos, mas que passou por muitos problemas de conservação, tendo ficado fechado por vários anos. Felizmente agora está em bom estado, passou por uma restauração ( é possível ver os testemunhos das pinturas originais nas paredes dos corredores ), e tem uma condição para os espectadores bastante confortável. Dessa vez eu fiquei no balcão superior ( ano passado sentei na platéia ), e pelo fato do teatro ser pequeno, de qualquer lugar dá para ver bem o espetáculo.
A história apresentada em cena é um pouco diferente da que estamos acostumados através da Cinderela da Disney. Não há uma fada-madrinha, o príncipe encarrega um ministro de encontrar uma noiva para ele, que não se importe com sua riqueza. O ministro então sai pelo reino vestido de mendigo, e é mal-tratado pelas irmãs da Cinderela, mas ela demonstra sua bondade oferecendo pão e água a ele. Depois, a casa onde elas moram é visitada pelo príncipe ( disfarçado de criado ) e por um criado ( fazendo-se passar por príncipe ). Óbvio que as irmãs interesseiras ( e o pai ) bajulam o falso príncipe, enquanto Cinderela se apaixona a primeira vista pelo ´criado´.
Para ir ao baile, não há carruagem feita de abóboras, ratinhos que viram cavalo, nada disso: quem providência o vestido e as jóias para Cinderela é o ministro. No baile ela é cortejada pelo falso príncipe, que testa as suas intenções mais uma vez, mas ela o rejeita dizendo-se apaixonada pelo criado. Cinderela e o verdadeiro príncipe tem então um breve encontro, ela vestida como uma dama da corte, quando na verdade vive como serviçal na casa do padastro, e o príncipe se fazendo passar por criado. Nenhum dos dois revela sua verdadeira condição, e ao se despedirem ela deixa um bracelete com o príncipe dizendo que quando encontrar o bracelete, saberá que está novamente com ela.
Depois do baile, de onde a Cinderela fugiu para não ser reconhecida pelas irmãs e o padastro ( ao contrário da versão Diseny, não há feitiço que se acaba à meia-noite ), o príncipe sai à procura da sua amada, que é encontrada sendo explorada na casa de Don Magnífico. Então a trama é desfeita, e na cena final, Cinderela se casa com o príncipe e perdoa todo o mal feito por suas irmãs e pelo padastro. Conto de fadas total...
Como era numa terça-feira, o elenco que se apresentou foi o ´elenco B´, formado por cantores mais jovens. Não sou especialista em ópera ( aliás, não sou especialista em nada ), mas deu para perceber os altos e baixos da interpretação. Na minha opinião, quem se saiu melhor foi o criado Dandini, interpretado pelo Johnny França. Além de ter se saído muito bem como cantor, acho que foi quem interpretou melhor seu personagem, tirando partido da comicidade do papel. As irmãs da Cinderela, Roseane Soares (Clorinda) e Debora Dibi (Tisbe) também tinham inflexões cômicas, mas acho que a maquiagem era tão carregada, com cílios postiços coloridos de uns 2 ou 3cm de comprimento, que matava qualquer expressão facial delas. Outro que acho que foi bem foi o padrasto da Cinderela, Gustavo Lassen ( Don Magnífico ). Já a protagonista, a Cenerentola ( Cinderela ) Josy Santos, eu tive a impressão de que não estava muito à vontade no início, mas foi melhor no final, mostrando uma agilidade vocal na cena do casamento que foi impressionante. E o par romântico da mocinha, o príncipe Don Ramiro / Cleyton Pulzi, eu achei um tanto apagado. Talvez porque fosse o ´mocinho´ da história, e mocinho é sempre sem-graça mesmo...
A cenografia não era nenhuma maravilha. De início há dois grandes painéis laterais, que com apliques de molduras e frontões, dão a sensação de um lugar imponente, ok. Mas o palácio do príncipe... o coitado devia estar falido. Acho que não foi só a falta de verba, o palácio com árvores recortadas e iluminação em contra-luz era feio mesmo... O coro ( 14 homens ) em algumas cenas entra com adereços, umas hastes metálicas com bolas nas pontas, que se transformam conforme a ocasião, sendo às vezes segurados pelos atores, às vezes transformados em adereços fixos da sala do trono. Outra vez, feinho, feinho...
Mas eu ia esquecendo de falar do coro. É sempre legal ouvir muitas vozes em uníssono, é um som que sempre me chama muito a atenção, e dessa vez não foi diferente. Não chegou a ser tão impactante pelo fato de serem só 14 cantores, mas de qualquer maneira, foi legal de ouvir.
Outra coisa: eu de vez em quando vou a concertos, a óperas, não tanto quanto gostaria, mas vou. E na média dá para perceber que é um público mais educado, dificilmente há quem precise ser repreendido por fazer barulho. Sempre tem as inevitáveis tosses, mas acho que deve fazer parte da ´etiqueta´ de se assistir a esse tipo de espetáculo... já repararam como sempre tem gente com tosse em apresentações de música clássica? Deve ser porque confundem ´espectador´ com ´expectorador´....
Mas o que eu queria registrar é que por estar no balcão, dava para perceber que dois ´espectadores´, ou melhor, dois ´corpos presentes´ na platéia não largavam o smartphone o tempo todo. E a luz desses aparelhos, no escuro, incomoda, desvia a atenção. Se eu estivesse perto dos dois ( um em cada lado da platéia, não estavam juntos ), com certeza teria tomado providências para que desligassem. Ah, e um detalhe: não eram jovens, eram dois senhores, um calvo e outro de cabelos brancos... vai entender? Compra ingresso, sai de casa, vai até o teatro pra ficar no smartphone? Se é só pra fazer companhia a alguém, que então fique esperando no lado de fora, acho que deve ser constrangedor para quem está em cena ficar vendo um rosto iluminado por uma tela azul na platéia.
La Cenerentola
Com Josy Santos, Cleyton Pulzi, Roseane Soares, Debora Dibi, Johnny França, Gustavo Lassen
Direção de Emiliano Patarra ( direção musical e regência ) e Davide Garattini ( direção cênica )
Música de Gioacchino Rossini
Theatro São Pedro, até 25/mar/13
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