A ópera do mês, na programação do Theatro Municipal foi Falstaff:
Eu não conhecia quase nada sobre essa ópera, que entra na programação dos festejos pelos 450 anos de nascimento de William Shakespeare - Falstaff é um personagem secundário que aparece obras do bardo - o que eu fiquei sabendo pela leitura do programa, sempre muito bom, além de bem produzido graficamente, os programas das óperas do Municipal são verdadeiros livros, com a transcrição de todas as falas, e mais importante, com pequenos ensaios sobre os espetáculos que são apresentados. Vale a pena adquirir e ir lendo antes da peça começar.
Sobre a parte musical, eu não conhecia nenhuma passagem da ópera, não reconheci nenhum trecho, nada. O que às vezes é uma vantagem, deixa a gente mais aberto para o que vamos ouvir.
A cenografia era a reprodução do próprio Municipal de São Paulo, mostrando as grades dos andares internos da platéia, como que refletidas num espelho. De início não entendi a razão disso, para mim só ficou claro mais no final da peça. Dessa vez não havia mudanças de cenário, do começo ao fim era sempre o mesmo, as modificações visuais ficavam apenas por conta da iluminação. Quando os atores entraram em cena, a intervenção feita na foto do Verdi na capa do programa ficou clara: parte deles estava vestida como punks. A ação foi levada para algum momento entre a década de 70 e os dias atuais, na Inglaterra, com punks convivendo com gente vestida quase como que no século XIX. Mas não é isso que chega a delimitar um conflito claro no enredo, punks contra aristocratas. Os figurinos eram caprichados, mesmo os punks não eram tão ´punks´ assim, tive a impressão de que o esmero visual os deixou com um visual menos agressivo, e mais para a tribo que aqui no Brasil conhecemos como ´góticos´.
Tudo na história gira em torno do personagem que dá nome à ópera, Falstaff. Ele é um velho boêmio e decadente, dono de uma taverna, e apesar de velho, gordo e falido, ainda acredita ser o próprio ´dom juan´, com um charme irresistível sobre as mulheres. Acho que não vale a pena ficar transcrevendo aqui o enredo da peça, que é bem movimentado. Mas se o personagem principal é inadequado à realidade que o cerca, o intérprete é perfeitamente adequado ao personagem. Ele praticamente não sai de cena, e sem demérito aos demais cantores, leva a obra toda nas costas. Acredito que seja em função dele ter alguns momentos de descanso é que há dois intervalos, já que nessas interrupções não acontecem mudanças de cenário. Estamos falando de Ambrogio Maestri, que tem inclusive o tipo físico correspondente ao personagem, com sua cintura bastante roliça, para dizer o mínimo. Ele tem uma presença magnética no palco, naturalmente todas as atenções se dirigem a ele. As falas mais engraçadas, as passagens mais fortes, tudo é concentrado no personagem Falstaff, e se o cantor não desse conta do recado, com certeza as três horas de apresentação se transformariam em uma tortura. De modo algum isso aconteceu, o Ambrogio Maestri dominou totalmente a cena, o tempo todo. Lendo sobre ele após a apresentação, fiquei sabendo que é considerado hoje o melhor intérprete para esse papel, tendo se apresentado no Metropolitan de Nova York, no Scala de Milão. Foi realmente uma noite de alto padrão, e apesar de não ser músico, acho que pelo fato de estar frequentando a temporada lírica desde o ano passado, está dando para perceber a evolução musical da Orquestra do Municipal. Não sei como expressar isso tecnicamente, mas me parece que o som está mais ´redondo´, mais equilibrado, todo mundo entrando junto, enfim, uma parte musical mais gostosa de se ouvir. E que venha Carmem, de Bizet!
Falstaff
Com Ambrogio Maestri, Rodrigo Esteves, Blagoj Nacoski, Adriane Querioz, Lina Mendes, Romina Boscolo
Ópera de Giuseppe Verdi, com libreto de Arrigo Bolto
Regência de John Neschling
Theatro Municipal de São Paulo, até 24/abr/14
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