Primeira peça do circuito Sesc no ano, e comecei muitíssimo bem. Sem dúvida ´A arte da Comédia´ já pode ser considerada uma das melhores do ano que começa:
O Sesc Santana para mim tem uma vantagem adicional: é perto de casa. Mas melhor do que isso, também é de fácil acesso para quem vai de metrô, conta com um estacionamento de tamanho razoável para as suas instalações, e sempre é possível encontrar vagas - ao contrário do Sesc Vila Mariana, por exemplo. Lá dentro, o teatro propicia uma boa visualização do palco em praticamente qualquer posição ( com exceção das extremidades próximas ao palco, claro ). Os degraus entre as fileiras são bem altos, e mesmo com alguém alto sentado à sua frente não haveria problemas. O desconforto acontece só pela distância entre as poltronas, muito pequena para acomodar as pernas... E mais uma coisa: tem dois lugares para jantar depois que gosto bastante e que ficam perto do Sesc Santana: o ´Pizzas e Pizzas´, na Av. Altinópolis, um lugar simples mas que para mim faz uma das melhores pizzas da cidade, e o ´Dona Carmela´, restaurante italiano na Av. Braz Leme, que foi o escolhido dessa noite.
Só que o que interessa mesmo é a peça... e foi ótima. De início há um monólogo feito pelo personagem Orestes ( Ricardo Blat ), onde ele fala basicamente sobre a arte de representar, e o que isso significa na vida de quem é tomado por essa profissão / paixão. Aliás, tempos atrás eu vi uma entrevista do Ricardo Blat, e o texto da
peça nem parecia coisa de um personagem, mas sim do próprio ator falando
de sua relação com os palcos. O ator certo para o personagem, sem
dúvida. O cenário nesse momento é dominado por um pano branco, que junto com uma parede com uma porta ao fundo, dá a medida de um pátio de 20x20 metros. Essa informação de medida é dada pelo próprio texto, que afirma que cenários precisos, com detalhes realistas é coisa de... cinema. Que no teatro as coisas são sugeridas, e o espectador preenche as lacunas com a sua imaginação. Ou seja, o cenário é a expressão clara do texto - bem legal.
Depois desse monólogo o tecido branco que representava a neve foi recolhido, e por debaixo dele havia um tapete. Mesas e cadeiras são colocadas sobre o tapete, um quadro desce do teto, ao fundo o cenário com a parede e a porta continua o mesmo, e pronto: fomos transportados a uma sala da prefeitura de uma pequena cidade italiana. Aí a história começa a ficar mais clara: Orestes é um diretor-proprietário de uma pequena companhia teatral, formada basicamente pela sua família. Ele tinha um barracão na periferia, onde encenava suas peças para o pessoal mais pobre da cidade. Agora ele até conseguiu do prefeito anterior a cessão do Teatro Municipal da cidade para continuar seu trabalho, mas não vem dando certo: a elite não quer ver suas peças, e o ´povão´ não se sente à vontade, e consequentemente não frequenta o espaço.
Depois de ser humilhado pelo aspone do novo prefeito, representado por Gustavo Wabner, Orestes consegue uma audiência logo no primeiro dia de trabalho do prefeito ( Thelmo Fernandes ), que é um forasteiro nomeado para cuidar da administração da cidade, e que portanto ainda não conhece ninguém. O prefeito tem uma lista de personalidades locais para receber - o padre, o médico - mas como ele foi um ator amador na juventude, tem algum interesse especial em teatro e atende a Orestes na esperança de ter um momento mais ameno em sua rotina.
Daí acontece uma conversa hilária entre os dois, com Orestes procurando ser subserviente ao prefeito para conseguir as benesses que foi pedir à administração pública ( um novo barracão para encenar seus espetáculos, já que o antigo foi consumido por um incêndio ), mas ao mesmo tempo discordando das ideias absolutamente convencionais do prefeito. É um jogo de esperteza de Orestes, uma malandragem que dá a entender ao prefeito obtuso que concorda com ele, ao mesmo tempo em que não nega as suas crenças - e o texto é divertidíssimo. A conversa entre os dois, simulacro e realidade, sonho e objetividade, leva a um embate no qual Orestes ao ver negado o seu pedido, diz que o prefeito pode muito bem ser enganado por seus atores, numa provocação em que procura mostrar ao prefeito o poder da fantasia. E aí, por um erro do aspone, Orestes sai com a lista dos ´notáveis´ da cidade que o prefeito deve receber naquele dia.
A dúvida se instala no gabinete do prefeito: quem irá aparecer nas audiências, as personalidades da cidade ou atores travestidos? E a cada palavra dita pelos visitantes que remete ao universo do teatro, o prefeito e seu assistente vão se convencendo de que estão diante de farsantes. O texto tem sempre esse tom dúbio, de desconfiança, e muito divertido. Essas referências à própria arte de representar levam a trama
a uma situação em que os personagens não sabem se estão vivendo a
realidade ou uma representação... E é essa a grande questão da peça: a vida é um teatro?
Ricardo Blat e Thelmo Fernandes realmente merecem muitos e muitos aplausos, a atuação dos dois é incrível. Os outros atores, claro, também. E eu não conhecia o autor, o italiano Eduardo di Felippo. Daqui pra frente vou ficar de olho para mais montagens de texto dele.
A Arte da Comédia
Com Ricardo Blat, Thelmo Fernandes, Erika Riba, Gustavo Wabner, Alcemar Vieira, Celso André, Alex Pinheiro,
Sávio Moll, Teresa Tostes, Poena Viana, Bruno Gonçalves, Sergio Somene e
Renato Bavier.
Texto de Eduardo Di Felippo
Direção de Sérgio Modena
Sesc Santana, até 09/fev/14
Assisti ao espetáculo em 22/02/14, penúltimo dia da temporada em São Paulo, com meu marido e meus filhos de 14 e 16 anos. Eu, felizmente, não havia criado expectativa sobre a peça, que comecei a ver bem despretensiosamente, mas ao desenrolar do texto tudo me deixando cada vez mais compenetrada, admirada e Feliz por estar ali . A interpretação dos atores é fantástica, a narrativa nos envolve e diverte ao mesmo tempo, aliás, muito hilária em diversos atos. Em alguns trechos se consegue observar a crítica, com relação a algumas questões atuais, mas de modo bem sutil e divertido.
ResponderExcluirEsta foi à primeira vez, que meus filhos adolescentes aceitaram ao meu convite para ir ao teatro. Durante a apresentação observei meu filho, Dener de 16 anos, que manteve o olhar fixo e atento ao palco de tal forma que me deixou impressionada e ao mesmo tempo satisfeita, pois imaginava que ele não ia se interessar tanto. Fato que confirma, mais uma vez, que a peça é realmente espetacular.
Resumindo, ficamos extremamente satisfeitos por assistir a esta peça.
Obrigada Marcel pela indicação deste maravilhoso espetáculo!!!