domingo, 23 de fevereiro de 2014

A Toca do Coelho

De volta ao Teatro Faap, e mais uma vez numa peça com o Gianecchini:



Mais uma vez, não havia programas disponíveis

Sábado à tarde, a cidade relativamente tranquila, mas antes mesmo de chegar ao teatro tive uma surpresa: o valor do estacionamento na Faap passou para absurdos R$ 40,00! Eu sempre soube que estacionar por lá era caro, mas me recusei a pagar esse valor. Por sorte o jogo no Estádio do Pacaembu só começaria depois, as ruas ainda estavam bem tranquilas, consegui vaga facilmente. E agora vendo as postagens antigas do blog e o extrato do ´Sem Parar´, vi que paguei R$ 20,00 em maio de 2013  ( quando fui à Faap assistir ´Quase Normal´), e ´apenas´ R$ 17,00 em setembro de 2013 ao assistir ´Cruel´! Como pode ter havido um aumento desses em apenas 5 meses? Simplesmente absurdo.


Mas de qualquer maneira isso não seria motivo para estragar a noite que estava só começando. Aliás, de sábado há duas sessões do espetáculo, sinal de que está fazendo muito sucesso. Essa foi mais uma peça com o Reynaldo Gianecchini, e de novo, a presença dele provocava suspiros na parte feminina da plateia. Gente gritando quando ele entrou no palco, assovios...  uma pena que isso aconteça. Na minha opinião, quem vai ao teatro com esse espírito de ver o ´ídolo´, acaba só vendo o ator, e não o personagem, e não aproveita o espetáculo como deveria. De certa maneira, acho que isso desqualifica o trabalho dele como ator, acaba sendo só um rosto/corpo bonito. E sem dúvida ele não merece essa reputação, é sim um ótimo ator, como demonstrou mais uma vez, assim como em ´Cruel´.

Ao entrar no teatro o cenário já estava exposto. O que víamos era uma casa, com  um sofá próximo a uma mesa de jantar e cadeiras, assim com uma geladeira, em primeiro plano. Do lado esquerdo, uma cama de casal, e mais ao fundo um dormitório infantil e jardim. Os  ambientes eram mais ou menos definidos pelas arestas de cubos em estrutura metálica branca, com uns 2,5m de lado. Em cima de alguns desses cubos, haviam ´tampas´ metálicas com uma tela fechando os quadrados,e que em alguns momentos receberam projeções de um filme.

A peça se inicia na conversa entre duas irmãs, Isa ( Simone Zucatto ) e Becca ( Maria Fernanda Cândido ). Isa é a irmã mais nova, inconsequente, e Becca a mais velha, mais centrada. Da conversa entre as duas ficamos sabendo que Isa está grávida, e Becca, que dobrava roupas de criança sobre a mesa, diz a ela que não vai me desfazer daquele enxoval, pois poderá servir para o bebê que está a caminho. Com a recusa de Isa, que não quer guardar as roupas para o bebê que ela nem sabe se vai ser menino ainda, é que ficamos sabendo que o filho de Becca faleceu. E o menino morto de certa maneira é o personagem principal da história.

A peça trata do luto, e do maior luto que alguém pode experimentar, que é a morte de um filho.  Depois do falecimento do único filho do casal, de 4 anos de idade, Becca e Paulo ( Reynaldo Gianecchini )  apresentam comportamentos opostos para continuar a viver após a tragédia. Becca se fecha em si mesma, Paulo busca apoio num grupo de ajuda. Becca vai aos poucos se desfazendo dos objetos do filho ( roupas, brinquedos ),  Paulo mantém o quarto do garoto intocado, e principalmente, guarda uma fita vhs com imagens do menino. É dessa diferença de encarar a morte que acontecem os conflitos entre o casal: vender ou não vender a casa, como reagir às tentativas de contato feitas pelo adolescente que atropelou o menino - Jason ( Felipe Hintze).  Mas estou deixando o principal de lado, a peça não é sobre os conflitos do casal, é sobre o luto. As diferenças de comportamento são apenas maneiras diferentes de expressar esse luto.

E aí vem o bom trabalho dos atores. Um tema como esse é fácil de escorregar para o melodrama, para o sentimentalismo barato. Mas felizmente isso não acontece, a gente percebe a direção tranquila que os atores tiveram. Tanto a Maria Fernanda Cândido quanto o Reynaldo Gianecchini vão muito bem em seus personagens, ela num registro mais contido, ele com mais alterações durante o desenvolvimento da trama, de um sedutor a um homem desesperado que chora copiosamente porque a mulher apagou sem querer a fita vhs com as poucas imagens do filho em movimento. São dois jeitos de encarar a dor, e cada um se desincumbiu muito bem da sua tarefa.

Mas tem uma grata surpresa na peça: o Felipe Hintze, que interpreta o adolescente que matou acidentalmente o garoto, tem um papel pequeno mas fundamental na encenação. É interessante ver um cara grande, corpulento, em papel tão delicado, com um personagem que obviamente se sente submisso aos pais do garoto morto por ter causado a tragédia da morte de uma criança, mesmo que involuntariamente. E quase que eu ia deixando de citar a Nat (Selma Egrei), mãe da Becca e da Isa, portanto avó do menino morto. Ela dá uns toques cômicos na peça, ajuda a tirar um pouco o clima pesado.

Outra coisa de que gostei bastante foi a interação entre o cenário, a iluminação com as projeções do garotinho, e o andamento da história. O cenário realmente ajudou a contar o enredo, com as projeções nas ´tampas´ dos cubos. Houve também um momento graficamente muito bonito, onde para marcar a passagem do tempo a luz ia desenhando as arestas de cada cubo. 

´A toca do coelho´  no final das contas é um ótimo espetáculo, um texto denso, forte, bons atores, bom cenário, e trata de um tema muito incômodo. Quem tem filho fica com um frio na espinha, só de pensar em passar por essa situação. Para mim isso é sinal de que houve uma empatia com os personagens, e não com os atores, não interessava se quem estava ali eram duas caras conhecidas das novelas da Rede Globo. Retomando o início do texto, que pena de quem não consegue ir além disso.




A Toca do Coelho
Com Maria Fernanda Cândido, Reynaldo Gianecchini, Selma Egrei, Simone Zucatto e Felipe Hintze
Texto de David Lindsay-Abaire
Direção de Dan Stulbach
Teatro Faap, até 23/fev/14

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