domingo, 21 de julho de 2013

Ah, a Humanidade! E Outras Boas Intenções

Depois de um certo intervalo sem ir ao teatro, mas pelo melhor motivo do mundo ( ficar com a minha filha! ), eis que estou de volta ao Sesc Consolação, para assistir  'Ah, a Humanidade! E Outras Boas Intenções':



Eu já conhecia o Sesc Consolação, ano passado assisti lá ´Toda Nudez Será Castigada´, do Nelson Rodrigues. É um espaço antigo, um teatro diferente das outras unidades do Sesc, pois lá o teatro dá diretamente para a rua, não está inserido em uma unidade maior.  Ou seja, não tem estacionamento. Felizmente, até hoje consegui parar relativamente próximo ao teatro, e nunca tive problemas. Mas estamos em São Paulo, há sempre moradores de rua na praça próxima ao Sesc, e infelizmente, a gente tem que se preocupar com a segurança, especialmente à noite. Não dá para saber de antemão se quem está ali deitado é somente um morador de rua, ou um ´nóia´  que pode te atacar sob efeito de crack.

Lá dentro o foyer é apertado, mas o que interessa mesmo, que é a sala de espetáculos, é bem confortável para a platéia. Dessa vez sentei no bloco dos fundos, mas ainda assim tinha uma boa visão do palco.

E ainda bem que as poltronas são confortáveis, com bom espaço para as pernas... porque dessa vez eu estava querendo que a peça terminasse logo. O meu interesse foi rever dois bons atores, Guilherme Weber e Celso Frateschi. Mas a peça é longa, e apesar de serem cinco temas diferentes entre si, acaba sendo enfadonho. Na prática, são cinco peças apresentadas em sequência, e na maior parte do tempo o que se vê são monólogos. Isso não teria o menor problema se o texto fosse mais interessante, mas não é o caso. O cenário é sempre o mesmo, com uma barafunda de coisas espalhadas pelo palco, onde se sobressai uma escrivaninha, à direita, e um poste tombado, que vai do fundo do palco ao centro.

É na escrivaninha que acontece a primeira parte do espetáculo: o Celso Frateschi aparece como um treinador de uma equipe esportiva ( se não me engano não há nenhuma menção explícita a qual esporte se refere ), que está dando uma entrevista coletiva, fazendo um balanço do ano que passou. De início vem aquela lenga-lenga de técnico que não conseguiu um bom resultado, dizendo que fez tudo de coração, pensando na torcida, e bla-bla-blá. Depois, ele vai se justificando, pedindo a compreensão de todos, falando que isso faz parte da vida, e acredito que para conseguir mais empatia, passa a falar da sua vida pessoal, da perda da mulher, ou namorada...  Nada é muito preciso, são frases vagas.  Mas o problema é que essa cena, onde ele fica parado atrás de uma mesa até os minutos finais, deve ter algo como 30 minutos de duração. Por melhor ator que seja o Celso Fratechi ( e ele é sim um ótimo ator ), não dá pra segurar a atenção por tanto tempo com um texto solto como aquele. Sinto muito se o New York Times chamou o autor, Will Eno, de ´novo Beckett´.  O texto é chato, e ponto.

A cena seguinte é sobre a gravação de vídeos para um site de relacionamentos, feitos simultâneamente por um homem e uma mulher ( Guilherme Weber e Erica Migon ). Dessa vez é mais interessante: vemos os dois gravando seus filmes ao mesmo tempo, mas separadamente, e conforme vão se expondo, procurando primeiro obviamente  mostrar suas qualidades, aos poucos mostrando seus lados mais patéticos, e há um encadeamento entre as falas, de tal maneira que é possível estabelecer paralelos ou diferenças entre as apresentações dos dois. Do mesmo modo que na primeira cena, conforme os personagens vão falando, o discurso vai saindo de controle, e acabam dizendo coisas além do que se espera na situação em que vivem. 

Em seguida, um novo monólogo: a Renata Hardy aparece como a porta-voz de uma empresa aérea que teve um acidente com um de seus aviões, sem sobreviventes. Assim como o treinador, ela sai do discurso que se espera numa ocasião como essa, e ao tratar diretamente com os parentes das vítimas, usa seu exemplo pessoal da perda do pai para tentar criar alguma empatia. De novo é o discurso saindo dos trilhos, com algumas falas que buscam o humor negro. Mas nessa parte, acho que o estoque de boa vontade da platéia já estava se esgotando, e havia bem menos manifestações do que no esquete anterior. E de novo, fiquei com a sensação de que a mensagem poderia ser transmitida de em muito menos tempo, digamos que se a tradução tivesse cortado 40% do texto, não haveria perda nenhuma para a compreensão da mensagem...  ou pelo menos do que eu entendi.  

Depois vem em cena de novo o Celso Frateschi e a Erica Migon. Ele é um fotógrafo, e ela sua assistente. Os dois tem como missão reproduzir uma foto histórica feita em Cuba, 100 anos antes, durante a Guerra Hispano-Americana. Dessa vez há alguma interação direta com a platéia, já que a câmara está virada do palco em direção a nós, e dois refletores colocados nas extremidades do palco também são virados para a platéia ( em certo momento, com tanta potência que incomodava os olhos, mesmo eu estando no fundo da platéia ). Somente nessa cena é que pela primeira vez há alguma interação entre os personagens, há diálogo entre eles, e como a foto não é mostrada, apenas descrita, acredito que cada um na platéia vá criando a sua própria imagem mental.  Essa foi a cena menos demorada, acredito.

E para terminar, após o flash do fotógrafo, os refletores voltados para a platéia são apagados, e vemos novamente em cena o Guilherme Weber e a Renata Hardy. Os dois são um casal, sentados em duas cadeiras de madeira, mas que representam os assentos de um carro. O ator faz os movimentos de quem está ligando um carro, mas cujo motor não funciona. Daí se estabelece um diálogo entre os personagens, quando ela expressa preocupação por chegar atrasada a um batismo, e ele diz que estão indo ao velório do pai dele. Daí a conversa parte para o absurdo, vão para um batizado ou para um enterro, há uma pequena discussão, e aparece um novo personagem, o ator Fabio Mazzoni, em uma pequena participação. Ele se apresenta como ´aquele que traz a mágica da vida´, ou algo assim, não recordo exatamente o texto. Sinceramente, a essa altura eu já estava mais interessado em quando aconteceria o final do espetáculo do que propriamente o encaminhamento da cena. 

Mas como tudo tem que chegar ao fim, as luzes se apagam e uma tv antiga, colocada no fundo do palco ( e que estava ligada enquanto o público tomava seus assentos antes da peça ) volta a funcionar, mostrando o trecho final da animação 'Mogli, o Menino-Lobo', da Disney. Então assistimos ao Mogli encontrar pela primeira vez uma menina e sair da selva em busca de novas experiências, dessa vez junto a humanos, e quando começam os créditos do filme, acaba a peça.

Está claro que eu não gostei do que vi, achei demorado demais, quase duas horas de espetáculo, e a meu ver sem justificativa para todo esse tempo. Não chega a ser um desastre,mas achei a peça enfadonha, e depois, pensando no que estava escrito no programa, também pretensiosa demais pelo que apresenta. 




'Ah, a Humanidade! E Outras Boas Intenções'
Com Celso Frateschi, Erica Migon, Fabio Mazzoni, Guilherme Weber e Renata Hardy
Direção de Murilo Hauser
Texto de Will Eno
Sesc Consolação, SP, até 28/jul/13



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