Nem sempre as coisas são como a gente gostaria...
Dessa vez fomos ao teatro do Sesc Belenzinho, na sala ´alternativa´ do 3° andar. Eu gosto muito de ir ao Sesc, tanto pela programação quanto pelas facilidades que tem ( estacionamento, lanchonete ) sempre com preços bastante em conta. Muito diferente de ir a alguns lugares onde o bolso da gente é esfolado sem dó...
´O abajur lilás, ou uma Medéia perdida na Augusta?´ me chamou a atenção por ser - pelo menos em parte - baseada numa obra do Plínio Marcos. No final da adolescência, quando comecei a ir a teatro adulto, era comum encontrá-lo vendendo os seus livros na porta dos teatros. E eu nunca comprei... Nem nunca vi uma peça dele. Tenho curiosidade de assistir ´Navalha na Carne´, por exemplo, e da próxima vez que for montada, com certeza não vou deixar de ver. Mas esse texto que foi apresentado ontem não é ´só´ o texto do Plínio Marcos, essa representação também é entremeada pela tragédia grega da Medéia, aquela que mata seus próprios filhos para fazer uma desfeita ao ex-marido... Ou seja, tragédia pra ninguém botar defeito.
Logo de início, o que a gente vê é um consultório de um psicólogo ( representado de forma bastante sutil, só por uma cama que naquele momento é um divã ), em que Medéia / Giro ( papel de Joaquim Goulart ), fala de suas angústias. Depois, aparecem as prostitutas ( Célia que também é Creonte, representada por Cácia Goulart, e Dilma / Ama, feitas por Bia Toledo ), e a trama vai se desenrolando dentro do pequeno bordel onde elas vivem. Aliás, o espaço onde a peça é apresentada tem dois grupos de assentos em pequenas arquibancadas, ao lado do ´palco´, e o cenário se resume a duas camas com rodízios, para que sejam deslocadas conforme o andamento da história, um lustre no centro e uma marcação no chão, que define a ´rua´. O ´cenário´ muda conforme a luz, ou seja, uma cama é o ´consultório´ e ela fica enquadrada por um holofote quando a cena se desenvolve nela. Outra é o ´mocó´ do cafetão, e a mesma coisa, é iluminada quando a cena se desenrola ali... e entre os dois espaços há a ´rua´, que é marcada por uma lona branca que transpassa todo o espaço, e que tem as linhas de marcação de piso feitas pela luz em certos momentos. Ainda antes da peça começar, quando entrei e vi a configuração geral do espaço, logo veio à mente o ´Afeganistão´, da peça ´No coração do mundo´ ( http://teatrodiariodebordo.blogspot.com.br/2013/01/no-coracao-do-mundo.html ). Mas infelizmente, o paralelo entre as duas peças só se deu na impressão inicial.
A maior parte do tempo, o que a gente vê em cena é o texto do ´Abajur Lilás´, que trata da relação entre prostitutas e um cafetão, que é um homossexual que na sua juventude também fazia programas. Existem momentos em que a linguagem é tão específica desse meio, com tantas gírias, que quase que a gente precisa de legenda... os impropérios que um personagem diz a outro são tantos, e numa sequência tão grande, que dá pra fazer um catálogo de xingamentos para qualquer ocasião. Pelo que sei as peças do Plínio Marcos são todas assim, e sem dúvida em ´O abajur lilás, ou uma Medéia...´, são nesses momentos que acontecem as cenas mais interessantes do espetáculo. Foram essas ´tiradas´ entre os personagens, o uso da ironia, da agressão verbal, que compuseram as cenas de que eu mais gostei. Então a gente vai acompanhando um pouco da história do Giro, a sua decadência, a preocupação da Dilma com o filho ( que nunca aparece em cena ), a falta de objetivos da Célia. Sempre através das agressões de parte a parte entre os personagens.
De vez em quando, há um corte e a cena volta para o consultório, onde Giro é atendido pelo Dr. Osvaldo ( Edmilson Cordeiro ). Aí a linguagem, claro, se modifica totalmente. E apesar de ser uma linguagem rebuscada, antiga, é mais fácil de ser compreendida do que o que as prostituas falam. Bom, pelo menos para mim foi... E quando a peça começa a se encaminhar para o final, entra em cena outra prostituta ( Leninha, interpretada por Inês Aranha ), que passa a dividir o ´mocó´ do Baixo Augusta com as outras duas.
Há então um conflito, que se resolve na cena final, com um assassinato. Essa cena é um tanto grotesca, com muito sangue, um exagero. Como eu disse logo que comecei a escrever o blog, a intenção é fazer comentários sobre as peças, ninguém aqui é crítico de teatro. Então, me dou ao direito de não ter gostado especialmente daquela cena, e pronto. Tem horas que a gente simplesmente não gosta, por uma questão estética mesmo.
Então, resumindo, não gostei do resultado final... todos os atores fazem dois personagens, a linguagem muda, mas eu achei que na verdade a gente não assistiu nem bem uma peça, nem outra. Não entendi a intenção do diretor com essa montagem, se é para mostrar do que as pessoas são capazes de fazer para satisfazer seus próprios desejos, acho que tanto um texto quanto outro isoladamente dariam conta disso muito bem. Traçar paralelos entre as duas histórias? Tem hora que é confuso, e na verdade, a história que é contada é do ´Abajur Lilás´, a Medéia entra como referência, citações. Pensando bem, talvez tenha sido essa a intenção do diretor ( que é o ator que interpreta o Giro / Medéia, Joaquim Goulart ), mostrar o mito e a ´aplicação´ do mito... Ele que me desculpe, mas acho que não conseguiu resolver isso bem. Achei que ficou um ´Abajur Lilás´ mais arrastado do que poderia, mais comprido, e também mais confuso, com o ´timing´ do texto prejudicado pelas intervenções do texto da Medéia. Como linguagem, também não achei grande coisa, nada que surpreendesse. E também não é questão de interpretação, apesar de alguns engasgos de quase todos os atores, não dá pra dizer que não atuaram bem. Principalmente a Bia Toledo, que se destaca dos demais.
O abajur lilás, ou uma Medéia perdida na Augusta?
Com Joaquim Goulart, Bia Toledo, Cácia Goulart, Inês Aranha e Edmilson Cordeiro
Direção de Joaquim Goulart
Adaptação de Vadim Nikitin, a partir da obra de Plínio Marcos e do Mito de Medéia
Teatro do Sesc Belenzinho, até 17/fev/13
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